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20 palavras para um novo mundo: Calendário

Uma série de palavras se infiltrou em nossa linguagem cotidiana este ano para descrever os novos tempos em que estamos vivendo. Pedimos a quatro grandes escritores – David Szalay, Rosie Millard, Paolo Gallo e Emma Dabiri – que escrevessem sobre algumas delas para nós. Paolo Gallo, que foi diretor de recursos humanos do Fórum Econômico Mundial em Genebra, diretor de aprendizagem do Banco Mundial em Washington DC e diretor de recursos humanos do Banco Europeu para Reconstrução e Desenvolvimento em Londres, escreveu sobre o significado de “Calendário”.

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Há algum tempo, escrevi que todos nós estamos nos transformando em manguezais, ambientes salgados onde os rios encontram os mares em que crescem plantas. Esta analogia se referia às fronteiras, antes nítidas e bem definidas, entre nossa vida real e digital. Se pararmos para refletir, não deixaremos de notar que muitas outras “fronteiras” foram alteradas, muitas linhas divisórias foram desenraizadas e colocadas de lado, pela Covid-19 e pelas novas normas sociais que surgiram deste episódio em nossas vidas. Você se lembra de quando, alguns minutos antes de sair do trabalho para as férias, você ativava o “fora do escritório” como uma resposta automática aos e-mails? Milhões de pessoas estão sem cargos há três ou quatro meses, com algumas empresas dizendo aos funcionários para não voltarem até 2021.

O que "fora do escritório" significa agora então? Agora ele descreve uma nova forma de trabalhar – o home office – que costumava significar sair de férias. O tempo e nossas agendas são parte dessas fronteiras mutáveis: uma espécie de mangue em que é difícil distinguir entre o tempo para nós e o tempo disponível para os outros. Por que isto está acontecendo? Porque houve um tempo em que o trabalho era um lugar frequentado pelas pessoas e seus contratos estipulavam um horário – o clássico das 9h às 17h, de segunda a sexta-feira – com agendas regulares e um certo número de feriados. Agora nem mesmo esta fronteira se aplica e nossas agendas e tempo assumiram valor e significado diferentes.

Essa importante mudança representa boas e más notícias. Vamos começar pelo lado bom: de acordo com uma pesquisa recente, os trabalhadores – sejam eles contratados ou autônomos – consideram a flexibilidade nos métodos e horários de trabalho como os principais fatores para escolhê-lo ou permanecer nele. A má notícia é que agendas esticadas e total flexibilidade podem ser confundidas com disponibilidade ilimitada, uma espécie de disponibilidade contínua – 24 horas por dia, 7 dias por semana, o ano todo – que não apenas desafia toda a lógica, mas leva, inevitavelmente, a um colapso nervoso.

Cabe a nós, portanto, traçar a linha divisória, definir claramente nossos limites. Dar e receber flexibilidade não é o mesmo que disponibilidade contínua.

O fio condutor destas palavras é fácil de entender, mas difícil de internalizar. “O que antes parecia preto e branco se transforma em tantos tons de cinza que nos perdemos no trabalho a fazer e contas a pagar”, cantou Bruce Springsteen em Blood Brother. Esta comovente canção nos convida a redescobrir o sentido da vida na relação com os outros, em espírito de fraternidade e solidariedade. Começamos por aqui, mesmo usando nossas roupas de ginástica.